VALETE OFICIAL
PL Antifacção: Governo sofre maior derrota até agora
VALETE OFICIAL
19 NOV. 2025

A sessão de ontem na Câmara dos Deputados expôs uma cena rara em Brasília: o governo levou um projeto para o plenário da Câmara, mas quem saiu vitorioso foi a oposição, com um texto que o Planalto tentou barrar até o último minuto. O PL 5582/2025, o chamado PL antifacção, foi aprovado por 370 votos a 110, mas na versão do relator Guilherme Derrite (PP-SP), ligado ao campo de direita e linha dura na segurança pública. O governo tentou tirar o projeto de pauta, tentou adiar a votação, tentou ressuscitar o texto original – e perdeu em todas as frentes.

No mérito, o texto aprovado é uma espécie de legislação de guerra contra o crime organizado. Cria o crime de “domínio social estruturado”, enquadrando facções, milícias e grupos paramilitares que dominam territórios, impõem toque de recolher, sabotam serviços e aterrorizam populações. Integrantes dessa engrenagem passam a pegar 20 a 40 anos de prisão, em regime hediondo, com progressão de pena bem mais lenta. Mesmo quem não é formalmente da facção, mas participa de ataques coordenados e bloqueios, pode pegar de 12 a 30 anos. O projeto também endurece a progressão em crimes hediondos em geral e mira o bolso das facções, facilitando a apreensão e perdimento de bens claramente incompatíveis com a renda declarada.
Duas emendas reforçaram ainda mais esse perfil. A de Marangoni (União-SP) atinge diretamente o CNPJ do crime, permitindo suspender empresas estruturadas para receptação de produtos roubados e impedir que seus administradores voltem a comerciar por anos, atacando o “empreendedorismo” que alimenta o caixa das quadrilhas. Já a emenda de Marcel van Hattem (Novo-RS) mexe em terreno sensível ao proibir alistamento eleitoral de presos provisórios e cancelar o título de quem já está alistado, sob o argumento de que quem está segregado da sociedade não deve influenciar o resultado das eleições – um recado claro contra o uso político do sistema prisional, ainda que isso vá parar no STF.
Do lado do governo, o roteiro foi de derrota em série. Destaques da federação PT-PCdoB-PV foram derrubados um a um: caiu a tentativa de retirar a punição a atos preparatórios (a Câmara decidiu que organizar o crime já é crime), caiu a tentativa de concentrar o dinheiro dos bens apreendidos no Fundo Nacional de Segurança Pública para blindar a PF, caiu a tentativa de derrubar a ação civil de perdimento de bens antes do trânsito em julgado, e caiu a tentativa de reintroduzir trechos centrais do texto original do Executivo. Tudo o que o Planalto tentou “amaciar” foi recusado; o que endurecia, passou.
No fim, o PL AntiFacção saiu da Câmara com uma marca política evidente: é um projeto que leva o carimbo formal do Executivo, mas o conteúdo e o DNA da oposição. Lula não só perdeu o controle do texto, como foi obrigado a assistir à construção de um marco punitivo que contraria anos de discurso garantista e relativização da criminalidade. Numa área em que a população exige resposta firme contra facções e milícias, o governo virou figurante no próprio palco e viu a Câmara entregar ao país uma lei dura, simbólica e muito distante da agenda que o PT e as esquerdas sempre defenderam.
Por: Geovane Leal Pedroso